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sábado, 2 de outubro de 2021

RUDIMENTOS PARA O GRAU DE COMPANHEIRO R.E.A.A.

O termo Companheiro Maçom é originado da expressão inglesa Fellow-Craft, companheiro de arte ou ofício. Esta terminologia era utilizada durante o período denominado Operativo e foi incorporada pela Maçonaria dita Especulativa, com seu viés esotérico e iniciático. Afinal, a ideia de progressismo em Maçonaria está associada justamente com a graduação de conhecimentos, o que remonta ao esoterismo maçônico da Escada de Jacó, tradicional símbolo da Ordem.

Sucedendo o Grau de Aprendiz, ou Grau1, O Grau de Companheiro é simbolizado primordialmente pela Pedra Cúbica, o oposto e evolução da sua fase anterior, que era a de Pedra Bruta. A Pedra Cúbica é pedra burilada, polida e perfeita, pronta para ser ajustada na Grande Obra de construção do Templo. Para isso, o Maçom utilizará outras ferramentas além das conhecidas no Grau de Aprendiz. Outrossim, o trabalho do Companheiro acontece na Coluna do Sul, parte iluminada pelos raios solares.

A correlação entre iluminação e Companheiro Maçom está representado pelo símbolo inerente ao Grau chamado Estrela Flamejante de Cinco Pontas. Este símbolo é originalmente advindo dos círculos ocultistas da Idade Média, o conhecido ocultista alemão Cornélio Agrippa de Nettesheim (1486-1533) teria sido seu inventor ou pelo menos seu difusor. Sua presença é definitivamente relacionada ao espiritualismo esotérico do Ritual que a adota. O pensamento hermetista que sintetiza os usos e atributos desta simbologia estava embasado numa interatividade entre homem e Deus pautada na magia e teurgia. O símbolo foi adotado pela Maçonaria através de Théodore Henri, barão de Tschoudy (1727-1769), mas a partir de 1737, este é um símbolo comum à Maçonaria Especulativa, não obstante nem todos os Ritos o adotam. Em Resumo, a Estrela Flamejante, símbolo inerente ao Grau de companheiro, possui uma função esotérica espiritualista que demarca a presença iluminativa divina no Homem, exegese concatenada com a Coluna iluminada do Sul.

Devido a Estrela Pentalfa, outro símbolo inerente é a letra G. No R.E.A.A. , o símbolo sintetiza varias qualidades atribuídas ao Companheiro. A instrução para os Companheiros cabe ao 1º Vigilante, sendo o 2 º Vigilante responsável pela Coluna do Norte, o que performa o X da Cruz de Santo André, esotericamente. A instrução para os portadores da síntese do G é a iminência para o Grau de Mestre, critério de assento no Oriente. Por isso, categoricamente, nenhum Maçom pode estar na espacialidade do Oriente sem antes contemplar a Estrela Flamejante com o G e receber a instrução do 1º Vigilante.

A transposição da Coluna do Norte para a Coluna do Sul é denominada de Elevação. À Loja de Companheiro temos a leitura reverencial do livro do profeta Amós (Am 7.7-8), presente no Livro da Lei. O painel Alegórico do Grau nos obsequia com outras referências bíblicas, a exemplo da Palavra de Passe do Grau. O Companheiro é o Maçom definitivamente evoluído ou Iniciado definitivo. A paternidade Teísta da Maçonaria está sempre associada aos elementos auferidos na Palavra Revelada.

PEQUENA DISCUSSÃO AO GRAU DE COMPANHEIRO: APONTAMENTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS.


Defensor da teoria historiográfica maçônica da transição, ou seja, que a Maçonaria dita Operativa se transformou gradualmente em Maçonaria Especulativa, posicionamento majoritário entre os historiadores maçons, Allec Mellor, em seu Dicionário da Franco-Maçonaria e dos Franco-Maçons, expõe que o Grau de Companheiro era o único da Maçonaria, sendo posteriormente dele derivado o Grau de Aprendiz (Entered Apprentice) inscrito, a nível inferior e, em nível superior, a Maestria. O Companheiro é o operário qualificado. O símbolo capital é a Estrela Resplandecente com a letra G (1989:94). Desse modo, o primeiro dos Altos Graus em Maçonaria foi o de Mestre Maçom, pois dos dois que havia na Ordem, apareceu o terceiro, o de Mestre, o superior aos demais.

Para José Castellani, no Dicionário Etimológico, o Grau de Companheiro é o Grau mais importante do simbolismo, pois representa o fim da escalada profissional nas confrarias de artesãos ou Maçonaria de Ofício. Na Maçonaria Operativa ou na Maçonaria dos Aceitos, havia apenas Aprendizes e Companheiros, destes últimos se destacavam os escolhidos para serem Mestres de obras. O Grau de Mestre Maçom foi criado em 1724, mas estabelecido na norma obediencial em 1738 (2004:119). Filosoficamente, ainda em Castellani, na Cartilha do Companheiro, escrito ao lado de Raimundo Rodrigues, o Grau de Companheiro reproduz a mística das Escolas de Mistério da Antiguidade, a exemplo das Eleusínias e do Pitagorismo. O Grau de Companheiro, esotericamente, alvitra a continuidade do símbolo da espiga do milho nos Mistérios de Elêusis, símbolo do trabalho, da abundância e dos ciclos da vida ou da imortalidade da alma, pregada na doutrina mística da Maçonaria; do Pitagorismo, o qual os três graus eram representativos para intuição, análise e síntese, a Maçonaria faz do Aprendiz o domínio da intuição, e do Companheiro, o domínio do método analítico, a fase mais avançada na evolução racional do homem (2004:29). Deste modo temos, no discurso de Castellani e Raimundo Rodrigues, o cumprimento histórico e existencial da Maçonaria como sendo continuidade dos Antigos Mistérios.

De acordo com Denizart Silveira de Oliveira Filho, em Da Elevação rumo à Exaltação, o Companheiro na Maçonaria Especulativa cumpre o papel institucional e místico de síntese histórica e doutrinária na qual se baseiam todas as fases de ascensão do obreiro ao mais alto grau de qualquer Rito (2013:26). Com efeito, a presença na Coluna do Sul é ponta de lança para o aperfeiçoamento proporcionado a partir do Oriente.

Tomando por base o método praticado por Harry Carr, em seu Ofício do Maçom, a data de registro de um documento a respeito de usos e costumes na Maçonaria não corresponde a um marco inicial. Por exemplo, o Grau de Mestre costumeiramente ensinado como nascido documentalmente entre 1724 ou 1725, sugere o autor, na verdade pôde estar presente nas Lojas em alguma data entre 1711 e 1725. Desta forma o documento não fala por si, sendo interessante considerar problematizações às atas e a suposição de que antes de ser consolidado, o uso e costume poderia ter sido registrado em algum documento perdido, considerando que a Maçonaria é adepta do tradicionalismo e indiferente a modismo. As evidencias documentais utilizadas pelo autor para discutir a legitimidade do Grau de Companheiro são datadas do início do século XVI, os Estatutos de Trabalhadores na Inglaterra e o Selo da Causa dos Maçons e Artífices em Edimburgo, lido junto com os Estatutos Schaw e as Atas de Loja de 1598 e 1599. Estes documentos confirmam a existência de um sistema de dois graus, um para Aprendiz e outro para o Companheiro maçom (ou Mestre). Documentalmente, a primeira concessão para Grau de Aprendiz está nas atas da Aitchinson´s Haven Lodge, na Escócia, a qual está escrita que Alexander Cubie se tornou Aprendiz, datado de 9 de janeiro de 1598. Nesta mesma data, a referida Loja faz a concessão do grau de Companheiro Maçom a Robert Widdersone, feito companheiro de Ofício. A documentação para o Terceiro Grau mais antiga da Maçonaria regular é a mencionada na Loja Dumbarton Kilwinning, Escócia, erigida em 1726, a qual na reunião de fundação estavam presentes o Grão-Mestre (isto é, o Venerável Mestre) com sete Mestres Maçons, seis Companheiros e três Aprendizes. Esta reunião, na data de 25 de março de 1726, marcou o progresso de Gabrael Portenfield, que em janeiro apareceu na reunião como Companheiro, sendo admitido unanimemente e recebido como Mestre da Fraternidade, renovou seu juramento(...). Para Carr, o documento certificou que Terceiro Grau é o progresso do Companheiro Maçom para Mestre Maçom, sendo ainda que o juramento era característica do esoterismo da Maçonaria na Escócia (2012:395). Porém, o autor ressalva que esta documentação não representam as datas exatas da introdução das cerimônias, ou seja, elas avalizam apenas a existência, à época, dos Graus que provavelmente existiam bem antes da documentação.

Problematizando o conceito de Grau em Maçonaria, Francisco Carvalho (Xico Trolha), no livro Companheiro Maçom, diz que na Maçonaria Operativa, pelo que está nos Manuscritos da Casa de Edimburgo, de 1696, a menção de que Aprendizes e Companheiros trabalhando juntos, não significa Graus, mas apenas um tratamento, sendo, outrossim, a palavra Mestre relativo a cargo na associação. As formas de tratamento foram transformadas em graus com ingresso de Maçons Aceitos. Para o autor, os graus foram criados entre 1670 e 1680, estranhamente, porém, ao apresentar a exposure de Samuel Prichard de 1730, pretende defender que não havia o uso do termo Companheiro em Maçonaria no século XVIII, preferindo o uso dos termos Aprendizes, Juniors e Sêniors (sic) (2006:33-38). Curiosamente, o autor utiliza uma fonte de 1725 para justificar a Exaltação a Mestre Maçom de três irmãos, entres eles Charles Cotton e Papillon Bull (Harry Carr também menciona este documento de 1725, mas comunica que esta mudança para o Grau de Mestre não é numa Loja Regular, mas sim na Sociedade Apolônia para amantes da Música e Arquitetura. Ou seja, não era sequer uma Loja maçônica (cf p. 395). A fonte de 1725 apenas certifica que havia este grau na Maçonaria, mas não que foi o início da Exaltação do grau). Assim sendo, se levarmos em consideração o posicionamento defendido por Carvalho que não havia Grau de Companheiro no século XVIII, então haveria apenas os Graus de Aprendizes (sic) e Mestre!

Para finalizarmos este estudo, analisemos o Poema Regius, escrito canônico maçônico, zelado pelo British Museum, datado entre os séculos XIV e XV, dividido em nove partes e transcrito por Robert Ambelaim. Este é um dos documentos mais importantes da Maçonaria Operativa. Neste documento há considerações razoáveis sobre a existência das categorias Aprendiz, Companheiro e Mestre. Na primeira parte há uma narrativa que encontra a origem da Maçonaria nos tempos do grego Euclides. Nela há referências à Geometria e que os estudantes desta arte, integrada à Maçonaria, eram chamados de Companheiros e seus professores eram chamados de Mestres. Na segunda parte há uma série de ditames, dentre os quais temos o 15º que diferencia os cargos, ou tratamentos, entre Companheiros e Mestres, sendo estes instados a ser honestos para com àqueles. Na terceira parte, a dos deveres morais e religiosos, os artigos que definem Companheiros e Mestres está mais costumaz. Nela temos o 1º que regula o serviço do Maçom como amante a Deus, à Igreja, e seus Mestre e Companheiros; o 3º que zela pelo silêncio e sigilo do Aprendiz com relação ao seu Mestre e Companheiros e toda a Loja; o 7º e o 8º exige do Aprendiz comprometimento moral e familiar para com os Companheiros e Mestre; o 12º comenta que nas Assembleias Gerais devem contar com a presença dos Mestres e Companheiros, além de outras autoridades do distrito; e no 14º temos que o filiado que deseja fazer parte da corporação deve prestar juramento perante o Mestre da loja e aos Companheiros a obediência ao Rei e as leis do país (1990: 196-197). Estes artigos demonstram uma certa independência e graduação entre duas categorias, Companheiro e Mestre, sendo que ao Mestre cabia o ensino aos Aprendizes e parece estar bem distintas as qualidades de cada qual, sendo o Mestre não apenas um Companheiro referencial mas um encargo de responsabilidade característico de função elevada na Loja. 

À.G.D.G.A.D.U
E. L. de Mendonça
SALUS SAPIENTIA STABILITAS

REFERÊNCIAS 

AMBELAIN, Robert. A Franco Maçonaria: origem, história, influência. São Paulo: Ibrasa, 1990.

ASLAN, Nicola. Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia. 3 ed. Londrina: Editora Maçônica A TROLHA, 2012.

CARR, Harry. O Ofício do Maçom. Tradução de Carlos Raposo. São Paulo: Madras, 2012.

CARVALHO, Assis. Companheiro Maçom. 3 ed. Londrina: Editora Maçônica A TROLHA, 2006. 

CASTELLANI, José. Dicionário Etimológico Maçônico. 2 ed. Londrina: Editora Maçônica A TROLHA, 2004.

CASTELLANI, José; RODRIGUES, Raimundo. Cartilha do Companheiro. 3 ed. Londrina: Editora Maçônica A TROLHA, 2004.

MELLOR, Alec. Dicionário da Franco-Maçonaria e dos Franco-Maçons. Tradução: Sociedade das Ciências Antigas revisado por Marina Appenzeller. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

OLIVEIRA FILHO, Denizart Silveira de. Da Elevação rumo à Exaltação: Comentários às instruções do Ritual de Companheiro Maçom do Rito Escocês Antigo e Aceito. Londrina: Editora Maçônica  A TROLHA, 2013.


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