O ESOTERISMO NO GRAU DO COMPANHEIRO
A Sabedoria não será entendida, muito menos compreendida, pelos rasos e os vulgares que estão associados à futilidade das baboseiras. O povo não se deixa pelos sábios nem os suportam e seu domínio consiste em estar fadados ao senso comum. Despreparados que não seriam sequer advogados sem reputação são transformados em Legisladores nacionais, fazendo do país servil à insensatez. Artífices como Salomão transformam a matéria disforme em mão de obra gloriosa, retirando toda rasura com o uso da espada necessária para purificar a atmosfera. O momento ideal da alta política será a concordância do Poder com Sabedoria.
Esta
luta entre bem e mal, justo e injusto, Profano e Maçom, está discernido da Dúada,
símbolo do Antagonismo dos seres, Caim e Abel, Ormuz e Arimã, Jachin e Boaz.
A Tríada, está simbolizando a Trindade da Divindade, o poder generativo,
capacidade produtiva e resultado, sendo o homem formado cabalisticamente de vitalidade,
alma ou mente, e espírito. Alquimicamente, seria sal, enxofre e mercúrio ou corpo,
alma e espírito. O Quatro , simbolizando o Jardim do Eden que estava formado
por um rio de quatro correntes, Pisom da terra do ouro, Giom da Etiópia ou
trevas, Hiddekel da Assíria e Eufrates. São João visionou quatro seres, Leão,
Boi, Homem e Águia e quatro bestas emergiram do mar na profecia de Daniel.
O
Cinco é a Deúda adicionada à Tríada. Está associada ao Pentalfa
de Pitágoras e é a Estrela Flamejante, a de cinco pontas. No Evangelho é
símbolo de abundância e aparece conectada ao número sete: Cristo alimentou a
população com Cinco pães e Dois peixes, e dos restos sobejaram Doze, ou seja, Cinco
mais Sete (Mt 14. 17-20). O Sete, particularmente sagrado, é muito comum
no Livro profético, com o Apóstolo São João escrevendo sete epístolas para sete
igrejas. A tradição veterotestamentária utiliza o número sete referenciando
cerimônias e manifestações espiritualistas. O Dez por juntar Sete com Três é
considerado o número da perfeição.
Pitágoras o representou com o Tetractys, que alinha diversos
significados místicos.
ANÁLISE
CONCEITUAL DA PARTE V DO ESTUDO DO GRAU DE COMPANHEIRO DE ACORDO COM O MORAL E
DOGMA DE ALBERT PIKE.
O
Companheiro Maçom reconhecido pela sua Sabedoria demonstra sua capacidade ante
os Profanos por não estar dependente do senso comum, nisto consiste sua
liberdade. O tema Liberdade é corriqueiro em todo o capítulo, sendo a principal
preocupação de Pike. A referência com a Espada está correlacionada a uma
exegese que a interpreta como sendo a Palavra, Sabedoria e Palavra estão
relacionadas de maneira esotérica pois, talvez, o autor não quisesse confundir
a terminologia Palavra, Revelação Divina, com a opinião humana que seria também
Palavra. Desse modo, a terminologia Espada, como sendo palavra dita com Sabedoria
e não exatamente Revelação Divina, é a preferida neste contexto de aplicação
política.
O
Maçom é um sábio, tendo como referência Salomão e todo o arcabouço doutrinal a este
símbolo associado, incluindo a Construção do Templo, a qual o Companheiro é
artífice da Pedra ideal a ser utilizada. A transformação em Pedra Cúbica está
baseada na experiência do Maçom, antes Aprendiz. A dialética religiosa e moral da
Maçonaria apresenta a separação entre o mal e o bem, serviço que a Ordem se propõe
não apenas com discursos, mas com doutrina e didática. Para que isso seja praticado,
há de se sistematizar uma ideia de o que é o bem e o que o mal. Para Pike, em
seu texto ora analisado, estas noções são referendadas a partir de
conceituações extraídas de Civilizações Antigas, sendo a Bíblia e a tradição
judaico-cristã uma espécie de corroboração. Nisto, a coerência com o R.E.A.A. é
patente. A Pedra Bruta é a formação típica do homem, raso, vulgar e servil a indolências.
O Maçom, por sua preparação, molda esta Pedra avalizado pela tradição Bíblia,
cujo arquétipo salomônico sintetiza sua atuação no mundo por sua sabedoria. O
Companheiro Maçom, experiente e Pedra Cúbica, seguindo a hermenêutica dos outros
textos deste estudo, assume sua nova posição que é o de inspirado pela Espada,
a Palavra de Sabedoria.
Para
finalizar seu comentário sobre o Grau do Companheiro, Pike apresenta o esoterismo
dos números, todos sancionados pela Bíblia. A mudança de Colunas do Norte para
a Sul é explicado pela doutrina da distinção entre o mal e o bem, ou seja, não
há relativismo moral para esta disciplina. Esta diferença entre duas partes está
simbolizada na Dúada, inclusive com a citação textual do autor se referindo à
dialética entre Boaz e Jachin, ou seja, Coluna do Norte e do Sul. Não que a do
Norte seja similar ao mal, mas ela representa uma alusão ao estágio trevoso que
deve e teve que ser superado pelo Maçom. Outra referência de dualidade está na oposição
entre Ormuz e Arimã, estas sim especificações tradicionais mesopotâmicas, de
que o bem e o mal existem distintamente. Na sequência, há o comentário da
Tríada sendo identificada com a Divindade. O número Três aqui é aplicado como sendo
doutrina para a ideia de Corpo, Alma e Espírito, de forte influência cabalística.
Para o esoterismo judaico, Alma ou nefesh e Espírito ou Rúah são terminologias
diferentes um pouco interrelacionadas. Em suma, Alma é a espiritualidade do
homem, ou melhor sua capacidade transcendental, e o Espírito é a presença divina
correspondente à busca do homem pela transcendência. Não há nenhuma exegese
conhecida bíblica ou de tradição judaica que explique que Alma se transforma em
Espírito, muito menos que isso seja corroborado em qualquer exegese maçônica
séria, pois isso desqualifica a ideia de Evolução e Exaltação inerente aos Graus
Simbólicos. O Maçom é, pelo R.E.A.A. e sua doutrina, transformado pela mudança
de posições, do Ocidente para o Oriente, sendo mantidas as especificações para
Aprendiz, Companheiro e Mestre, jamais a Coluna do Norte se transforma em
Coluna do Sul, nem esta se transforma em Oriente, nem muito menos o Ocidente se
transforma em Oriente. Por isso, Alma jamais se transforma em Espírito. A
tradição Católica e a Reformada, outrossim, entendem que Alma e Espirito sejam
a mesma coisa em se tratando do homem, mas nem nisso se aceita que haja uma
transformação de Alma para Espírito. Curiosamente, o Apóstolo Paulo faz esta
distinção em sua carta aos Tessalonicenses: E o mesmo Deus de paz vos
santifique completamente; e oro a Deus que todo o vosso espírito, e alma,
e corpo sejam preservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor
Jesus Cristo (1Ts 5.23). Vale salientar que, na tradição cristã, o conceito
de Espírito Santo, uma das partes da Tríada Divina, é uma Pessoa e se faz
presente no homem, seja no Batismo, seja na conversão. Aprofundarmos neste
assunto fugirá ao escopo da análise, mas alguns pontos são necessários para entendermos
a hermenêutica do Templo. Por exemplo, alguns autores maçônicos interpretam os
Três Degraus exatamente como sendo Corpo, Alma e Espírito, revelando
esotericamente a natureza iniciática da Ordem. Além de Pike, temos, em
antiguidade, Jules Boucher (1902-1955), que escreveu A Maçonaria Simbólica (1948),
entendendo que os Três Degraus são alusivos ao esforço do Maçom em
ascender a posições superiores (2015:163). Na atualidade, autores
brasileiros como Luiz Fachin, da coleção Virtude e Verdade, entende que os
Três Degraus simbolizam os planos físico, astral e psíquico, ou seja corpo,
alma e espírito (2015:255). Posição semelhante é a de Paulo Hernandes, do livro
Formação de Aprendizes do R.E.A.A., pois interpreta que os Três Degraus sejam
corpo, alma e espírito (2017:120). Esta discussão é salutar pois estas
interpretações são influentes na confecção dos rituais esporadicamente, se tornando
um mecanismo de obediência.
O
Número Quatro, em Pike, é um símbolo de iniciação e de conclusão. Sua exegese
parte do Jardim do Éden e finaliza com o Apocalipse de João, inclusive com os
seres viventes Leão, Boi, Homem e Águia. Talvez o símbolo da Águia seja uma
referência ao seu uso nos Altos Graus e na heráldica do Supremo Conselho.
Quiçá, Pike falhara em não fazer uma alusão entre o número Quatro e os Elementos
Herméticos da Iniciação, característica do R.E.A.A., aludindo apenas às águas do
Éden no que se refere a iniciação, depois fala de profecias de Daniel e São João
Apóstolo.
O
Cinco é interpretado como sendo a união entre o Três e o Dois, importante
salientar que Pike não declara ser o Dois ou o Cinco o número do Companheiro. Afinal,
a inconveniência da Dúada é interferida pela Tríada, como sendo uma superposição
desta sobre aquela. O Cinco, portanto, é símbolo da transformação a favor da Verdade
e da bonança. Por isso, a multiplicação dos pães é o mesmo que a Abundância,
conceito trabalhado tradicionalmente no Grau. A Estrela Flamejante,
sinal do Companheiro, é referenciada como sendo a Estrela pentalfa pitagórica,
sem qualquer aprofundamento, no entanto.
O
Sete não possui relação de concordância para sua formação, ou seja, não é apresentado
como sendo, por exemplo, união de Quatro com Três, ou Cinco com Dois, pois está
interpretado de modo individualizado. Seu conceito é de número sagrado, para Pike
a estruturação profética dos autores bíblicos está baseada pelo Sete,
associando com a interação de Deus com o Homem na Revelação. De acordo com
Castellani, no Rito Escocês Antigo e Aceito, o Sete é o número místico
do Mestre, simboliza a perfeição alcançada na evolução espiritual (2006:154).
Aliás, para Castellani, o Três e o Sete são números igualmente perfeitos e sua
exegese é igual à de Pike, pois para interpretar o Dez faz-se o mesmo artifício
de associar dois números, coisa que não foi feita também para o Sete, que foi
unir o Três e o Sete. A diferença entre os autores está na ideia de perfeição
entre os números. Na exegese de Pike, perfeito é apenas o Dez, união entre os números
sagrados do Sete e Três, mas para Castellani os dois números são perfeitos e
simbolizam o G.A.D.U. Não há uma diferença cabal entre perfeito e sagrado na
ideia de Pike, implicitamente o Dez também representa Deus, mas o método utilizado
é um pouco mais complexo do que o utilizado convencionalmente. O Dez é representado
pelo Tetractys pitagoriano formado pela soma piramidal de várias letras Yod, o
que definitivamente não é usual.
O comentário de Pike para o Grau de Companheiro não é um instrucional e sua didática e comprometimento deixam a desejar. Possivelmente, não era esse seu foco. A instrução do Moral e Dogma é dedicada aos Altos Graus do R.E.A.A. sendo a parte de Graus Simbólicos um pouco negligenciada para evitar polêmicas ou apenas por enfado do autor. A compreensão do capítulo exige um pouco de entendimento e pesquisa sobre a doutrina do Grau, não sendo indicada para o Companheiro recém graduado, devido sua complexidade. Porém, para o Maçom instrumentalizado a mensagem se torna um pouco mais profunda e com esoterismo aplicado à atuação político-social. A serventia do texto está quase que totalmente na leitura de entrelinhas, onde estão soltas as pontas que formam a doutrina do Companheiro naquela época nos Estados Unidos, que tinham autoridade suficiente para definir os contornos do Rito Escocês. Por fim, não encontramos um autor ateu, nem dado ao paganismo, nem satanista, nem mesmo anticristão. Pike, ao lado de outros, são referencias para o que compreende por filosofia maçônica.
BOUCHER, Jules. A Maçônica Simbólica ou a Arte Real reeditada
e corrigida de acordo com as regras da Simbólica Esotérica e Tradicional.
Tradução de Frederico Ozanan Pessoa de Barros. 2 ed. São Paulo: Pensamento,
2015
CASTELLANI, José. O Rito Escocês Antigo e Aceito: História
Doutrina Prática. 3 ed. Londrina: Editora Maçônica “A TROLHA”, 2006.
FACHIN, Luiz. Virtude e Verdade Graus simbólicos Tomo I. 2
ed. Porto Alegre: Editora Agir, 2015.
HERNANDES, Paulo Antonio Outeiro. Curso de Formação de
Aprendizes do R.E.A.A. 2 ed. Londrina:Editora Maçônica “A TROLHA”, 2017.
PIKE, Albert. Moral e Dogma do Rito Escocês Antigo e Aceito.
Tradução de Celes Januário Garcia Júnior e Glauco Bonfim Rodrigues. Birigui:
YOD, 2011.
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