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sexta-feira, 27 de novembro de 2020

TEMPLO MAÇÔNICO: UMA ANÁLISE CONCEITUAL


 

O Templo é o lugar de reunião dos maçons, ternário composto de Sala dos Passos perdidos, Átrio e Templo. Loja é conceitualmente o Templo? Existe esoterismo na concepção de Templo Maçônico? Por que os maçons são reunidos em um Templo dedicado e consagrado ao Grande Arquiteto do Universo? A análise conceitual tenta dar contribuições ao entendimento desta doutrina maçônica.
Trabalho dedicado ao Ir∴ Zeno Schwengber (gêmeo)


A palavra Templo é derivada do latim Templum, “que designa incialmente um setor do céu delimitado pelos áugures para observar os fenômenos naturais”, mais tarde este termo foi utilizado para o edifício em que se faziam estas observâncias onde se faziam a contemplação (MONTEIRO, 1996:48). Etimologicamente, temos que a palavra tem relação com a adoração de fenômenos da natureza e ao infinito e suas causas, ou a Deus. Os hebreus, por exemplo, ao tempo do Êxodo, faziam suas contemplações em tendas com aspectos de Templos até a necessidade de fazerem uma tenda denominada Tabernáculo para melhor dar significado ao seu espaço sagrado e dar “casa” à Deus, representado pela Arca da Aliança contendo a Palavra de Deus através dos Dez Mandamentos. Foi com este significado de reunir fiéis em um espaço sagrado e com a presença de Deus que o Rei Davi idealizou( 2Sm 7.1-6) e seu filho, Salomão, construiu(1Rs 5.3-5; 8.17) o famoso Templo de Jerusalém, com a mesma concepção religiosa do Tabernáculo do deserto.

A MAÇONARIA E O TEMPLO DE SALOMÃO

A relação conceptiva entre o entendimento de Templo para os hebreus e para a Maçonaria é componente da doutrina simbólica. A terminologia “ Templo” latina e não exatamente “casa” possui a mesma ideia e funcionalidade de adoração e contemplação. De acordo com Nicola Aslan, os nomes dados ao que chamamos de Templo de Jerusalém ou Templo de Salomão eram BethJehovah ( Casa de Jehovah) ou Beth El. O “Templo” construído entre 1003 e 1006 a.C, em Israel, recebe ajuda do Rei de Tiro, Hiram, que envia para o reino materiais e artífices. Dentre estes, está Hiram Abiff , metalúrgico, que será símbolo da espiritualidade maçônica especulativa ( 2012:1352).

A Maçonaria Operativa fazia suas reuniões em canteiros de obras das igrejas medievais. Não havia um local “oficial” ou consagrado para que houvesse sessões maçônicas. Posteriormente, com os maçons Aceitos, ocuparam tavernas, o que evidentemente não era um local adequado para espiritualidade. Com a evolução para Maçonaria especulativa, a ideia de Templo para as reuniões foi amadurecida e a Lenda de Hiram, adotada no Ritual em 1723, referenciou, para o mundo maçônico, o Templo de Jerusalém, “arquétipo ideal e iniciático” para as Lojas maçônicas (2012:1353). A Grande Loja da Inglaterra, em 1776, construiu seu Templo para o funcionamento de suas sessões, pondo fim às reuniões em tavernas; em 1788, o Grande Oriente francês estabelece que apenas serão reconhecidas Lojas que estejam se reunindo em Templos.

Para José Castellani, a identificação com o Templo de Jerusalém está em objetos e utensílios usados para a ornamentação e ritualística nos Templos Maçônicos. Não sendo uma “cópia fiel”, a Maçonaria é entendida como “herdeira indireta” do Templo Salomônico e nisso a faz possuir as Colunas do Pórtico, a presença de Deus pelo Tetragrama ou o IOD, o Mar de Bronze, o altar dos perfumes, mesa para pães da proposição, Candelabro de Sete Braços, Estrela de Seis Pontas, Escada de Jacó, dentre outros (2009:147-149). O ritual maçônico , por isso, é reconhecido como válido tão somente no interior de um Templo.

O TEMPLO ESOTÉRICO MAÇONICO

O Templo Maçônico representa o Universo e por isso o Templo de Salomão, que representa pelos esoterismo cabalístico a Criação pela Geometria Sagrada, é o protótipo “para ministração de seus ensinos e aplicação simbólica de suas doutrinas” ( FIGUEIREDO, 2016:469).Com efeito, o Grande Oriente do Brasil, a exemplo das determinações originais , reconhece que “o local de reunião da Loja chama-se Templo” (RITUAL DE APRENDIZ, 2009:14). O Templo, de acordo com o Ritual, possui a largura de Sul ao Norte, o comprimento de Oriente ao Ocidente, a altura da terra ao céu e a profundidade da superfície ao centro da Terra , e estas medidas se dão porque “a Maçonaria é universal, e o universo, um Templo” (2009:173). Na Instrução para o Grau de Aprendiz, o Ritual insiste que é correto o 1º Vigilante responder ao Venerável o motivo da situação do Templo do Oriente ao Ocidente, pois no Oriente é que acontece o início da vida e se estende para o Ocidente, “até o fim dos tempos”. A ideia de infinitude está ainda representada pela Abóbada Celeste, desta feita, herança egípcia que entendia que seus Templos eram simbolicamente elevados ao espaço extra terrestre (CASTELLANI, 2006:200) e Infinito é conceito astronômico para Universo e conceito maçônico para uma das denominações de Deus por sua eternidade(Dicionário Maçônico 2008:212) . Desse modo, contextualizando tradições de povos antigos, que ansiavam pelo espaço sideral, e a hermenêutica simbólica de que o universo é um Templo onde se dá a Criação, convém que o Templo não seja uma representação limitada da Terra, como dizem alguns exegetas, mas a representação do Universo, pois além das evidências comentadas, comporta a presença do Grande Arquiteto do Universo pelo Delta Sagrado com o Onividente, o Tetragrama ou o IOD, ao modo que o Templo de Salomão comportava a Arca da Aliança.

A Geometria, parte das Artes Liberais reverenciadas pela Maçonaria, é a instauração da ordem, harmonia e síntese para o Templo Maçônico. Os maçons, na época operativa, faziam as catedrais através de técnicas que encontravam no símbolo G de Geometria a constatação da utilização de numerologia mística que os hermetistas denominavam dimensões espirituais. Segundo Mark Stavish, os principais influenciadores e teóricos para a “Geometria Sagrada” foram Francisco Giorgi (1466-1540), franscicano estudioso da Cabala aplicada ao Templo de Salomão e dos ensinos de Vitrúvio (80 a.C- 15 a.C), famoso arquiteto romano e considerado místico por esotéricos medievais; e Henrique Cornélio Agrippa (1486-1526), também franciscano, que relacionava o poder das figuras geométricas com os números, sendo Templos espécies de talismãs. Estes autores influenciaram nas teorias arquitetônicas utilizadas pelas guildas de construção e que o G é herança da composição esotérica na doutrina maçônica operativa, conservada para os maçons modernos especulativo ( 2011:120-121). A Maçonaria espiritual era conhecida entre os operativos que dispunham os Templos Sagrados cristãos a favor de eflúvios ativados por “forças mágicas da natureza e do cosmos”. Por isso, o Oriente do Templo Maçônico com os degraus de Aprendiz, Companheiro e Mestre simbolizam a elevação gradual e hierarquizada para outros planos espirituais (CASTELLET, s/d: 112-113).

O Templo Maçônico é formado por Sala dos Passos Perdidos, Átrio e Templo(CAMINO, 2018:15) . Outros autores acrescentam a Câmara das Reflexões (QUEIROZ, 2010:33). A Sala dos Passos Perdidos antecede do Átrio, ambiente de recreação, assinatura de presenças, galeria de homenagem, espaço de trivialidade. Esse ambiente despojado simboliza o ambiente frequentado pelo maçom antes de sua Iniciação, sem os princípios da Ordem estava com os “passos perdidos” (ASLAN 2012: 1224 e CAMINO, 2008:359). O Átrio antecede o Templo, nele estão, frequentemente, as Colunas Bronzeadas B e J, elo de ligação entre Templo e Átrio. O Átrio do Templo é um espaço de reverência. O Templo é o espaço dos trabalhos maçônicos, da veneração ao G.A.D.U. A Câmara das Reflexões é “anexo” e parte do Templo Maçônico. Oculto, está no centro da Terra ou no “interior” do Templo, de dentro deste espaço o homem é transmutado para a Iniciação. O ternário exotérico maçônico é formado por Sala dos Passos Perdidos, Átrio e Templo, e o ternário esotérico é formado por Átrio, Câmara das Reflexões e Templo.

O Templo Maçônico, além de simbolizar o Universo por seus símbolos exteriores e materiais, representa ainda o Homem por sua espiritualidade. Nicola Aslan, citando J. Boucher, defende que o “Templo Ideal” é construído por cada Maçom que é uma Pedra. O Templo é o corpo purificado que recebe o “influxo da vida universal” ou, de acordo com Blavatsky, a manifestação no mundo físico da potência e do esplendor do Espírito, simbolizados pelo Templo salomônico pela Sabedoria do construtor(2012:1354-1355). O influxo espiritual é recebido pelo Maçom no ato da Iniciação e é Espírito a presença do G.A.D.U no maçom ( 2008:163).

O Maçom aprendiz desbasta a Pedra Bruta, sua consciência ou Alma, e o Maçom Companheiro burila a Pedra Cúbica, tornando-se Pedra adequada para a fundamentação do Templo espiritual. Esta perspectiva gradual é representada pelos Degraus que estão para o trono no Oriente, o Santo dos Santos onde está o Dossel com o símbolo do G.A.D.U.

Autores maçons como Rizzardo da Camino e Albert G. Mackey concordam em ser o Templo símbolo do Ser Humano. Esta definição está textualmente no Dicionário Maçônico (2008:384) e no O Simbolismo da Maçonaria , que considera o Templo eterno (2008:75). De acordo com Luiz Fachin, o Templo é místico na Alma do homem e por isso representa o Universo e toda a Criação (2018:246).

A LOJA MAÇÔNICA 

A Loja Maçônica é muitas vezes conceituada como sendo sinônimo de Templo Maçônico. No entanto, a definição mais adequada é que signifique união de maçons. O Templo como sendo o espaço de reverência ao G.A.D.U, a exemplo do Templo de Jerusalém, reúne os maçons, mas sua união em reverência à Divindade é que denominamos de Loja.

A etimologia da palavra, para Nicola Aslan, deriva do anglo normando “Loge” que introduziu na língua inglesa “Lodge” durante o período em que os normandos dominaram a Inglaterra (1066) e foi utilizado para nomear edificações. Na Idade Média, foi significado para alpendre coberto de palha ou galpão e, por fim, a oficina dos pedreiros (2012:697).

Na concepção de Álvaro de Queiroz, a Loja Maçônica é toda a estrutura espacial, incluindo o Templo(2010:34). O Ritual do Grande Oriente do Brasil, por sua vez, esclarece que “o local de reunião da Loja chama-se Templo”(2009:14) e uma das funções do 1º Vigilante é “fechar a Loja” ao pôr do Sol, no Ocidente, despedindo os obreiros, ou seja, encerrando a reunião (2009:47-48). Na ritualística, Loja é a reunião e não o Templo. Corroborando esta conceitualização, Rizzardo da Camino dilucida: “Maçonicamente, Loja é o agrupamento de maçons em trabalho. Não existe, propriamente, uma construção, um edifício denominado Loja (...). A Loja surge dentro de um Templo” (2008:252).

Os maçons reunidos são maçons em Loja e sem Loja não há Maçonaria ( RODRIGUES, 2011:137-138). Na concepção espiritualista que cada maçom é Pedra de edificação para o Templo interior, entendemos que a união de vários Templos espirituais formam a Loja Maçônica. O influxo espiritual que é a presença de Deus no Templo espiritual íntimo do maçom dá autenticidade a singularização apropriada do conceito de Loja em Maçonaria, sendo a Loja a síntese de vários Templos espirituais e não um Templo material.

CONCLUSÃO

O Templo Maçônico é um espaço de reverência e consagrado ao G.A.D.U, sua conceitualização e prática são motivadas à exemplo do seu protótipo, o Templo de Jerusalém. A presença de Deus dá significado à ideia de Templo, pois então seria outro conceito utilizado pelos maçons especulativos no desenvolvimento de sua doutrina. A Maçonaria pratica em seu Templo atos de reverência em conformidade com sua tradição esotérica e mística e não configura apenas um salão de triviais reuniões, o que desposa uma espiritualização característica à Ordem.

A formação do Templo Maçônico, além das influências do Templo salomônico, é composto por inspirações cabalísticas de medidas que dá sentido ao esoterismo característico maçônico, herdeiro de antigas tradições hermetistas e que eram parte do imaginário de seus antecessores operativos, os construtores de catedrais. O esoterismo maçônico é de cunho judaico cristão mas em muito de sua doutrina estão presentes influências gregas, egípcias e mesopotâmias. Por definição, o Templo Maçônico não é o mesmo que a afamada e conhecida “Loja”, sendo esta os maçons em união dentro do Templo e que possui um sentido, além de conceitual, também esotérico pois é a substância do Templo. Representando o Universo, o Templo contempla toda a Criação e o Infinito.

A Maçonaria não é exatamente um religião, mas é uma entidade com elementos de religiosidade. O Templo com suas instâncias espirituais é o exemplo de que o espaço sagrado em Maçonaria deve ser respeitado com toda reverência de como fosse um Templo religioso característico de qualquer religião pois em seu meio o Ritual também é dedicado ao Criador.
À.G.D.G.A.D.U.
Emanoel L. de Mendonça Jr 
SALUS SAPIENTIA STABILITAS.

REFERÊNCIAS

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